genoma
humano consiste de 3 bilhões de nucleotídeos e informação
para um total de aproximadamente 40.000 genes. Incluindo DNA espaçador,
seqüências sinal e DNA codificante, as seqüências
únicas constituem de 70% à 80% do genoma humano.
O restante do genoma consiste em seqüências repetitivas
não codificantes e de função desconhecida.
Seqüências repetidas em tandem constituem aproximadamente
10% do genoma e a unidade varia de 5 a 250 pares de bases, repetida
centenas de vezes. Este tipo de região é denominada
DNA satélite devido à tendência de formar
bandas satélites em centrifugação de gradiente.
Regiões
polimórficas do tipo VNTR
Uma fração de DNA repetido consiste de regiões
denominadas mini-satélites ou repetição
em tandem de número variável (VNTR variable
number of tandem repeats). Os VNTRs exibem uma enorme
variabilidade e são constituídos de 9 à
100 pares de bases repetidos seqüencialmente em loci cromossômicos.
As primeiras seqüências VNTR descritas tiveram aplicação
imediata na área forense, assim como no auxílio
ao mapeamento do genoma humano. O termo DNA fingerprint,
ou perfil de DNA, foi inicialmente concebido por Alec Jeffreys
em 1985. O termo demonstra a alta variabilidade destas regiões
do genoma, de maneira que seja improvável a existência
de dois indivíduos com o mesmo perfil genético,
a não ser no caso de gêmeos univitelinos.
Os marcadores VNTR são analisados através da técnica
RFLP (restriction fragment lenght polymorphism),
a qual é baseada em mutações que alteram
seqüências no DNA de um indivíduo, de modo
que enzimas de restrição podem perder a capacidade
de clivar aquele DNA em posições ainda susceptíveis
à clivagem nos DNAs de outros indivíduos.
Assim, indivíduos podem ser diferenciados pelo comprimento
de seqüências VNTR do DNA gerados após a ação
de uma enzima de restrição. O padrão de
fragmentos é característico e herdado por indivíduos
geneticamente relacionados, uma vez que a localização
dos sítios de restrição é típica.
Desta forma, por locus, cada sonda hibridiza com dois segmentos
de DNA, correspondentes aos alelos materno e paterno de cada
indivíduo. A metodologia consiste em extração
de DNA genômico e digestão com enzima de restrição.
As mais utilizadas são Hae III, Pst I e Hinf I. Em seguida,
os produtos da digestão são separados em gel de
agarose, desnaturados e transferidos para membrana própria
para hibridização, técnica esta denominada
Southern-blot. Uma sonda quimioluminescente, ou marcada radioativamente,
complementar às seqüências VNTR é,
então, utilizada para, através de hibridização,
detectar as seqüências alvo. Os alelos VNTR, identificados
pelas sondas, são visualizados após sensibilização
de filmes de raios-X. A mesma membrana, com o DNA fixado, pode
ser utilizada para hibridizações seqüenciais
com diferentes sondas, específicas para seqüências
VNTR em diferentes cromossomos (figura 1).
De maneira geral, como resultado da utilização
de apenas 5 sondas VNTR, são obtidos índices de
paternidade/maternidade superiores a 100.000, gerando probabilidades
de paternidade/maternidade superiores à 99,999%. Índices
tão elevados, observados com a utilização
de poucas sondas, são decorrentes da alta variabilidade
de loci VNTR.
Durante quase 10 anos, esta metodologia foi empregada para a
análise de DNA em casos de paternidade. A análise
de regiões VNTR do DNA foi pela primeira vez empregada
para resolver um problema de imigração na Inglaterra.
Logo em seguida, foi utilizada por um tribunal britânico
para comprovar a participação de um suspeito em
casos de abuso sexual cometidos entre 1983 e 1986.
Em outro episódio, considerado um constrangimento nacional,
o resultado da análise de regiões VNTR foi responsável
pela acusação do presidente dos Estados Unidos,
Bill Clinton de mentir publicamente ao negar ter mantido relações
sexuais com a funcionária da Casa Branca Monica Lewinsky.
A vinculação do perfil genético, obtido
a partir de uma mancha de sêmen em vestido, com Clinton,
foi imediata, já que a probabilidade do perfil obtido
era de 1 em 7,8 trilhões de pessoas.
Como desvantagem, a tipagem de alelos VNTR requer DNA íntegro
e em grande quantidade (100-500 ng), tornando praticamente inviável
a tipagem de amostras biológicas antigas, degradadas
ou com pouca quantidade de DNA. Atualmente, a metodologia é
pouco utilizada em investigações genéticas.
REgiões
polimórficas do tipo STR
As seqüências curtas repetidas em tandem STR
short tandem repeats ou micros-satélites,
apresentam repetições com unidade básica
de 2-6 pares de base e o polimorfismo, assim como nos loci VNTR,
também está baseado no número de repetições.
Devido ao pequeno tamanho, geralmente menor que 350 pares de
base, alelos STR podem ser analisados após amplificação
pela técnica PCR. Esta característica permite
que amostras com quantidades diminutas de DNA, ou apresentando
alto grau de degradação, possam ser tipadas. Desta
maneira, a possibilidade de realizar análise de loci
STR superou várias limitações inerentes
à manipulação de seqüências
VNTR, tornando a tipagem de marcadores STR a metodologia eleita
para a tipagem por DNA de vestígios biológicos
em geral.
Locus STR analisado individualmente não apresenta poder
de discriminação comparável ao locus VNTR.
No entanto, a análise conjunta de regiões STR
proporciona resultados altamente satisfatórios. Desta
forma, na tipagem de regiões STR, através da técnica
PCR, são utilizados, usualmente, sistemas multiplexes,
onde vários pares de primers orientam simultâneas
reações de
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amplificação, gerando
produtos de múltiplos loci. Os alelos amplificados são
separados em eletroforese em gel de poliacrilamida.
Com o avanço da tecnologia, foram desenvolvidos processos
automatizados para análise de loci STR. Acoplou-se a produção
de primers marcados com diferentes corantes fluoróforos
e sistemas de detecção a laser em aparatos de separação
eletroforética. Os produtos de PCR marcados com fluorocromos
podem ser detectados em tempo real mediante eletroforese capilar
ou pode-se realizar a detecção pós-eletroforética
em escaner de fluorescência (figura 2).
Sistemas para amplificação simultânea de até
16 loci STR já encontram-se disponibilizados para uso corrente
em tipagem humana por DNA. Desta maneira, a tipagem, ou identificação
de um indivíduo, pode ser realizada em um único
tubo, no qual múltiplas reações de amplificação
estarão sendo processadas.
Uma seqüência específica dos cromossomos X e
Y, denominada amelogenina, também pode ser amplificada
simultaneamente em um sistema multiplex, proporcionando a determinação
do sexo do indivíduo doador da amostra biológica.
A análise automatizada de regiões STR é a
metodologia eleita por todos os países para identificação
de indivíduos e tipagem de criminosos devido à rapidez,
acuidade e alto poder de discriminação conseqüente
à análise de múltiplas regiões STR.
Devido à alta sensibilidade e especificidade das reações
de PCR em sistemas desta natureza, amostras biológicas
contendo DNA até mesmo na ordem de picogramas podem ser
tipadas, como por exemplo um fio de cabelo com bulbo ou caspas
eliminadas do couro cabeludo.
STRs do cromossomo Y também são analisados. Ao contrário
de STRs autossômicos, estes representam um haplotipo, devido
à ausência de regiões homólogas no
cromossomo X. Este haplotipo é transmitido de pai para
filho, ou seja, é perpetuado pelas gerações
descendentes. Portanto, a tipagem de STRs de cromossomo Y proporciona
o rastreamento de linhagens paternas. A tipagem de STRs do cromossomo
Y se mostra extremamente útil em casos de delitos sexuais,
nos quais, geralmente, a evidência em análise constitui
uma mistura de material genético do agressor e da vítima
com quantidades ínfimas da fração masculina.
Atualmente, pode-se afirmar que a análise de polimorfismos
do DNA está consolidada cientificamente, e não resta
dúvidas de sua importância perante os tribunais.
Várias organizações nacionais e internacionais
foram criadas para assegurar que a tipagem de regiões polimórficas
no DNA seja realizada adequadamente pelos analistas em seus laboratórios.
Estes grupos, constituídos por cientistas forenses, têm
o objetivo de estudar novos polimorfismos do DNA, resolver problemas
de aplicações forenses, padronizar procedimentos
e protocolos além de estabelecer um rigoroso controle de
qualidade para laboratórios e seu pessoal técnico-científico.
Para a análise estatística dos resultados, é
necessário conhecer previamente as freqüências
com que são representadas as diferentes variantes alélicas
na população. Portanto, bancos de dados devem ser
construídos, abordando a distribuição de
freqüências destas variantes em distintos grupos populacionais
e étnicos.
Em países com grupos populacionais bem definidos, como
os Estados Unidos, foram gerados bancos de dados de marcadores
genéticos polimórficos para grupos étnicos
(raciais) distintos, como negros, caucasianos, hispânicos
e orientais. No Brasil, devido à forte miscigenação
de raças, foram desenvolvidos bancos de dados representativos
da população geral. Foi verificado que a distribuição
de freqüências alélicas não parece variar
significativamente entre os diferentes grupos étnicos.
Andréa Carla de Souza GóesPh.D.,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Laboratório
de Diagnósticos por DNA
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