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Incoerências de um governo

Marco Antonio Abrahão

educação volta, mais uma vez, a ser tema central de nossa análise. Dentro de sua função de fiscalizar e orientar o exercício da profissão, o Conselho Regional de Biomedicina jamais escondeu a sua grande preocupação com relação às atividades das instituições de ensino, especialmente nos aspectos ligados à formação universitária em geral e biomédica em particular.
Sempre defendemos a tese de que
é fundamental a formação de profissionais de reconhecida qualidade diante do impacto do constante aumento da oferta de trabalho somado às conseqüências da globalização, como a automação de procedimentos técnicos, alta produtividade, redução de mão-de-obra e da remuneração. Todos esses fatores transformaram totalmente o mercado, que passou
a ser muito exigente.
E, em meio a esse cenário, é absolutamente necessário saber se efetivamente as instituições educacionais garantem cursos de comprovada qualidade. Até porque a ótima formação acadêmica é requisito mínimo fundamental para o sucesso de um profissional, juntamente com a necessária e permanente atualização técnico-científica e administrativa, domínio de pelo menos dois idiomas e conhecimentos em informática.
Mas de que adianta tanta preocupação se o governo é incoerente em suas ações? Ao mesmo tempo que adota, por meio do Ministério da Educação (MEC), primeiro o “Provão” e depois o Enade para avaliar a qualidade do ensino, o Conselho Nacional de Educação e a Câmara de Educação Superior aprovam o Parecer 329/2004, de 11/11/2004, dispondo sobre carga horária mínima dos cursos de graduação — que no caso da Biomedicina foi reduzida para 3.200 horas.
Nesse sentido, inclusive, o CRBM protestou tão logo soube dessa decisão, enviando ofício ao presidente do CNE, Roberto Cláudio Frota Bezerra, enfatizando não existirem razões que justifiquem a alteração dessa carga horária. Ao contrário, para garantir a qualificação dos profissionais da área de saúde é imprescindível aos cursos um tempo mínimo, não condizente com as 3.200 horas determinadas no referido parecer, para transmitir os conhecimentos necessários aos acadêmicos e habilitá-los ao bom desempenho e à competência profissional, em face da grande responsabilidade desses profissionais perante o Estado e a Sociedade.
Em coerência com as definições das Diretrizes Curriculares, que coaduna com nosso entendimento, é inadmissível considerar a possibilidade de diminuir a carga horária dos cursos ministrados, face às

conseqüências negativas na excelência do ensino do curso de Biomedicina e na formação acadêmica. Por isso, o CRBM manifestou-se contrário à homologação desse parecer e repudiou a carga horária estabelecida, solicitando a retificação do parecer para estabelecer a carga mínima de 4.000 horas.
Por outro lado, ainda no tocante a incoerências, cedendo a pressões de maus profissionais do ensino, o governo tem permitido a dispensa de professores com mestrado e doutorado, abrindo espaço para os generalistas. Vários coordenadores de cursos de Biomedicina têm recebido determinação de seus superiores para que reduzam os quadros de docentes.
Observa-se que, em meio a mudanças nas instituições de ensino, muitos mestres e doutores têm sofrido demissão sem justa causa visando a redução de custos, sem a mínima preocupação de seus superiores com a qualidade do ensino. Essa situação também é provocada pela existência dos cargos de confiança. E, a prevalecer os cargos de confiança, deixa de ser reconhecida a competência dos profissionais de carreira. Portanto, o procedimento ideal seria dar a devida credibilidade aos profissionais de carreira, evitando
assim decisões absurdas.
Incoerências não faltam, também,
na reforma universitária que o governo quer implantar e que é fortemente defendida pelo ministro Tarso Genro.
O anteprojeto do MEC, distribuído em cem artigos e dezenas de incisos e parágrafos, mostra o desconhecimento de seus autores a respeito das funções do ensino superior.
A universidade, pública ou privada, existe para gerar e transmitir conhecimento, para organizar e difundir especialidades, para produzir e disseminar pensamento crítico e para formar quadros gerenciais e lideranças intelectuais. Necessitam, portanto,
de liberdade administrativa,
curricular e pedagógica para poder cumprir essa sua missão histórica.
E justamente esse atributo é negado pela proposta de reforma do MEC.
Enfim, não podemos deixar de registrar o nosso descontentamento diante da política equivocada adotada pelo governo. A impressão que fica é que ainda não foi feito um diagnóstico cuidadoso e realista dos verdadeiros problemas da educação no País. Como avançar, como crescer se as autoridades educacionais têm linhas diferentes de conduta? Há necessidade que tudo seja revisto e que o bom senso prevaleça.


Marco Antonio Abrahão
é presidente do CRBM – 1ª Região